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Exportação

BC volta atrás e reabre crédito para exportadores

Prazo de antecipação de receitas passa para cinco anos e deve favorecer entrada de dólares.

BC volta atrás e reabre crédito para exportadores

O Banco Central voltou atrás ontem em medida adotada em março com a declarada intenção de fechar uma das portas de entrada de capital especulativo para ganhos com taxas de juro no país. Ontem, passados nove meses, o BC reconheceu que a medida afetou fortemente empresas exportadoras de bens ou serviços ao restringir uma importante fonte de financiamento.

Em uma sessão extraordinária na segunda-feira, a diretoria colegiada do BC decidiu ampliar para cinco anos o prazo do chamado Pagamento Antecipado de exportações, conhecido por PA. Trata-se de uma modalidade de financiamento na qual o exportador obtém junto ao importador ou a uma instituição financeira a antecipação das receitas oriundas da exportação futura. O uso dessa modalidade cresceu nos últimos anos e com a utilização de prazos cada vez maiores, o que levou o Banco Central em março a restringir essas operações a 360 dias (antes não havia limitação de prazo). Na medida anunciada ontem, o BC elevou esse prazo de antecipação da receita para até cinco anos. Essa modalidade não paga Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) ou Imposto de Renda e, por isso, é bastante vantajosa.

Ao restringir o prazo a um ano, em março, o BC falou na necessidade de “disciplinar” o mercado para evitar operações que chegavam a dez anos e tinham objetivo especulativo (o chamado carry trade, em que se toma dinheiro barato no exterior para aplicar em juros no Brasil).

Agora, depois de “avaliações constantes”, o BC diz ter sentido que há uma demanda muito forte por esse tipo de operação por parte dos exportadores e resolveu ampliar o prazo, já que o mercado já está “disciplinado”.

A mudança nas regras, que tende a favorecer uma maior entrada de dólares no país, teve efeito imediato sobre a taxa de câmbio.
 
“Essa é uma boa notícia para o exportador, por ser uma operação de baixo custo e liquidez boa”, afirmou o executivo de uma empresa de celulose – o setor exporta mais de 90% da produção não destinada à fabricação de papel. Agora, com as novas regras do BC, a tendência é que o pré-pagamento volte a figurar no planejamento das companhias. Segundo o executivo, durante o período em que o prazo do pagamento antecipado ficou limitado a um ano, a escolha das empresas foi por apenas renovar as operações dessa natureza já existentes. Emissão de bônus e linhas do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social, que historicamente aparecem como fontes relevantes de financiamento ao setor, foram usadas também como alternativa nesse período.

Sem a opção do pagamento antecipado, a maior parte das grandes corporações do agronegócio foram buscar linhas de financiamento tradicionais para ampliar produção, no entanto, com taxas mais altas do que as oferecidas pelas linhas de pré-pagamento a exportadores. Para o diretor-técnico da União da Indústria de Cana-de-Açúcar (Unica), Antonio de Padua Rodrigues, as recentes medidas cambiais do governo são positivas na medida em que ajudam a reduzir o custo do financiamento às empresas. Além disso, ampliam-se também as alternativas do setor se financiar no longo prazo.

Em 2011, antes da restrição de prazo do pagamento antecipado, dos US$ 50,46 bilhões que ingressaram no país por meio dessa modalidade, US$ 23,3 bilhões correspondiam a operações de longo prazo (acima de um ano). Esse montante foi equivalente a 9% de todo o fluxo cambial via contratos de exportações (US$ 251,185 bilhões) daquele ano. Do total do PA de longo prazo, 8% eram relativos a operações de um a dois anos, 19% equivaliam a operações de um a três anos e 80% respondiam a operações acima de três anos.

Nos dois primeiros meses deste ano, houve ingresso de US$ 5 bilhões de PA de longo prazo, com aumento de 46% na comparação com igual período de 2011. Se esse ritmo tivesse se mantido até o fim do ano, teria havido um ingresso de cerca de US$ 30 bilhões por meio de PA de longo prazo. Ainda no primeiro bimestre do ano, apenas vinte empresas foram responsáveis por 80% de todo o PA de longo prazo, que correspondeu a 13% das exportações (US$ 38,119 bilhões). Isso dá um retrato de quão concentrado estava esse mercado.

Depois da medida, em março, PA de longo prazo (operações acima de um ano) desapareceu. E as operações de até um ano totalizaram US$ 28 bilhões de março a 23 de novembro.

No mercado financeiro, a flexibilização das regras para o financiamento de exportações reforçou a percepção entre agentes de mercado de que, além de promover ajustes sazonais de liquidez, a autoridade monetária pode estar se antecipando a um cenário ainda mais complicado em termos de fluxo no próximo ano.

Para profissionais, a medida anunciada ontem e a pesada intervenção no câmbio anteontem deixam claro que o Banco Central não permitirá uma disparada nas cotações do dólar, embora uma apreciação de forma gradual seja tolerada ou mesmo desejada.

“Ainda não falaria em problemas de liquidez, mas com certeza a liquidez agora não está boa. Somado a isso tem muita demanda de dólar por parte de companhias para remessas de lucros e dividendos, o que pressiona ainda mais o fluxo e puxa o real para baixo”, afirma a estrategista de câmbio do RBS, Flavia Cattan-Naslausky.

A estrategista avalia que o quadro atual, composto pela demora da atividade econômica doméstica em reagir e pelas incertezas externas, dá todos os sinais de que o real deverá se enfraquecer mais no próximo ano.

Para alguns profissionais, contudo, a presença notável do BC no mercado desde segunda-feira ainda não dá argumentos para o entendimento de que a autoridade busca defender um patamar para o dólar, mas principalmente garantir a oferta de moeda no sistema e evitar disfuncionalidades. No mês passado, o presidente da autarquia, Alexandre Tombini, já havia dito que a autoridade monetária estava pronta para atuar a fim de que o mercado funcionasse dentro da normalidade e que, se fosse preciso, ofertaria liquidez.

“Para mim, o recado explícito do BC é: ‘se faltar liquidez, estou aqui para oferecer'”, considera o especialista em câmbio da Icap, Italo Abucater. Ele até prevê que o dólar possa sofrer uma pressão de baixa no início do ano, em meio às entradas de recursos sazonais, mas considera que a probabilidade de o real se enfraquecer ainda mais em 2013 é factível em meio à possibilidade de a Selic voltar a cair no ano que vem, diante da deterioração das expectativas para o crescimento do PIB.

Para o economista-chefe da Órama Investimentos, Álvaro Bandeira, parece bastante explícito, dadas as atuações recentes do BC, que o patamar de R$ 2,10 ainda é o desejado. “Acredito que na cabeça do BC esse patamar seja aquele que não prejudica os exportadores nem o investimento”, diz Bandeira.