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À Rio+20, com o meu carinho: A visão holística na compreensão da Terra - por Thiago H. B. Corrêa

Compreender um sistema tão complexo como a Terra é um desafio que demanda tempo. No entanto, me indago se teremos tempo para compreender pelo menos a nós.

À Rio+20, com o meu carinho: A visão holística na compreensão da Terra - por Thiago H. B. Corrêa

Compreender um sistema tão complexo como a Terra é um desafio que demanda tempo. No entanto, me indago se teremos tempo para compreender pelo menos a nós.
 
Seria sorte habitarmos um planeta que nos é tão apropriado? Por que a Terra é o único planeta do Sistema Solar, o único planeta de que temos conhecimento, onde a vida evolui e prosperou? Essas são algumas das perguntas que minha mente limitada busca encontrar respostas. E creio que tais perguntas não são particulares, mas incitam a muitos.
 
Será que Rousseau tinha tanta certeza quando disse que a natureza do homem é boa, mas a sociedade que o corrompe? Não sei! Mas concordo com Bacon: Saber é poder! Tanto que com o saber o homem aprendeu rápido a aprisionar e manipular as pessoas. Poucos possuem poder, porque muitos são proibidos de acessar o saber.
 
Somos tão fiéis e obedientes que fizemos tudo o que Deus ordenou: “Ide e povoai toda a Terra, dominai a toda criatura”. Entretanto, esquecemos o momento de parar, e mais, esquecemos que por mais divina que a Bíblia seja, está sobre posse de mãos maculadas.
 
Evoluímos, conquistamos e povoamos a Terra. Mas o que tudo isso gerou? Um planeta doente e febril. Um planeta transformado, ou melhor, deformado.
 
Nos últimos anos se tornou comum em eventos científicos as temáticas ambientais. Fóruns, encontros e reuniões. Todos discutindo e buscando possíveis mitigações à “doença” da Terra. É lastimável reconhecer que só damos o devido valor para as coisas, depois que as perdemos.  
 
Altas temperaturas, desertificação de áreas férteis, furacões e abalos sísmicos são apenas reações da Terra a todos os danos que a provocamos, e as conseqüências para a humanidade serão provavelmente muito piores do que qualquer guerra. Temos que estar cientes que não é a Terra que é frágil, nós é que somos. O planeta tem resistido a catástrofes muito piores do que as que produzimos e nada do que fazemos o destruirá, pelo contrário, nos destruirá.
 
É evidente que não estamos preparados para reconhecer que somos parte da Terra e não donos desta. Se a culpa de tudo isso está no nosso gene egoísta, já é hora, com todo o avanço genético que nós produzimos, de manipulá-lo e substituí-lo por um gene mais altruísta e menos ganancioso.
 
Por volta do ano de 1800, o governo norte-americano tentou comprar as terras onde viviam os índios Suquamish. Em defesa, o índio chefe responde ao presidente com uma carta aplausível, com as seguintes palavras: “O Presidente em Washington nos diz que deseja comprar nossa terra. Mas como pode alguém comprar ou vender o céu? E a terra? A idéia é estranha para nós. Se não somos proprietários do frescor do ar ou do brilho da água, como pode alguém compra-los de nós? (…) Somos parte da terra e ela é parte de nós. As flores são nossas irmãs. O urso, o cervo, a grande águia são nossos irmãos. As cristas rochosas, o orvalho sobre a pradaria, o calor do corpo do cavalo e o homem, todos pertencem à mesma família. A água em movimento dos riachos e rios não é somente água, mas, sim, o sangue de nossos antepassados. (…) O homem não teceu a trama da vida; ele é apenas um de seus fios. O que faz à trama, faz a si mesmo”.
 
Por que os índios são capazes de interpretar o planeta com essa visão? Será que foi após eles se tornarem civilizados? Ou será após a catequização?
 
Continuo me perguntando, por que a maior parte da humanidade tem como livro de cabeceira a Bíblia e não possui a mesma idiossincrasia? Falta-nos interpretação? Ou interpretamos somente o que nos convêm? Gênesis 2.7: “E formou o Senhor Deus o homem do pó da terra”. Em outras palavras: os mesmos elementos que constituem a Terra se fazem presentes em nossa constituição como animais: água (aproximadamente 71%), ferro, cálcio, carbono, hidrogênio, oxigênio, nitrogênio entre outros. Assim como os nossos sistemas (cardiovascular, respiratório, nervoso) atuam para manter o organismo saudável, o planeta, com seus sistemas dinâmicos, os ecossistemas, atuam para a mesma finalidade.
 
Como será que seremos lembrados? Os dominadores da Terra? Certamente não! Este mérito já foi conquistado há 3,8 bilhões de anos, durante o éon Arqueano, pelas bactérias. Talvez, seremos lembrados como a praga da Terra. Se existir, é claro, alguém para lembrar.
 
É evidente que alteramos o metabolismo do planeta. E, assim como todo organismo em desequilíbrio, a Terra tem buscado se autorregular.
 
Uma enfermidade pode evoluir para quatro estágios num organismo: a convalescença (cura), a cronicidade, a morte do organismo ou a simbiose, uma parceria baseada no benefício mútuo. Tivemos a chance de um relacionamento harmonioso com a Terra, de simbiose, mas infelizmente nos comportamos como parasitas.
 
O planeta está se autocurando, e não há nada que podemos fazer para cessar este processo. Porém, não somos apenas uma peste sobre a Terra, a qual deve ser eliminada; somos parte dela, e a sua primeira espécie conscientemente inteligente.
 
Amanhã se inicia na cidade do Rio de Janeiro a Rio+20 – Conferencia das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável. A Rio+20 é assim conhecida porque marca os vinte anos de realização da Rio-92 e deverá contribuir para definir a agenda do desenvolvimento sustentável para as próximas décadas. Espero que a bela paisagem e o clima tropical do Brasil inspirem a todos e tragam para o encontro uma atmosfera de ações reais, concretas, e acima de tudo, humanas. É justamente aqui que reside meu maior temor. O como essas “ações humanas” podem ser interpretadas.
 
Subproduto do metabolismo da Terra, somos uma das espécies existentes, mas a única com condições de agir sobre o coletivo e garantir aos seres futuros um planeta melhor, saudável e provedor.  

Por Thiago H. B. Corrêa, professor do curso técnico em Química do Colégio Porto dos Bandeirantes, Mestrando em Educação da Universidade Metodista de Piracicaba e aluno do curso de especialização em Ciência e Tecnologia na Universidade Federal do ABC. E-mail: [email protected]